Angola sabe da sua própria experiência, como um homem, um único homem, pode provocar um sofrimento incalculável que vai para além de qualquer razão, senão a de procurar de forma desumana satisfazer a sua ambição pelo poder. E, Angola sabe quão rápida a paz pode ser abençoado uma vez que este homem é eliminado”
Há cerca de 20 anos Savimbi dirigiu um dos seus actos mais macabros na Jamba, seu antigo quartel-general. De lenço vermelho enrolado ao pescoço, farda verde e pistola à cintura, o líder da Unita lançava à fogueira dezenas de mulheres e respectivos filhos.
Os nomes das desafortunadas eram anunciados pela tenebrosa voz de Jonas Savimbi. Pouco depois, mulheres e crianças, arrastadas por soldados armados, ardiam em chamas flamejantes.
A morte de Vitória, uma bela jovem benguelense, marcou de forma significativa os espectadores de tão triste teatro. Perante a iminência da morte, Vitória dispensou que fosse arrastada por soldados, dirigiu-se ao fogo com os próprios pés e lançou-se, sendo aí consumida pelas chamas até às cinzas. A jovem não soltou um único grito e, ante o fatídico momento, fitou o líder da Unita e profetizou: Tu não vais vencer e o teu fim será triste.
No dia 22 de Fevereiro de 2002, Jonas Savimbi é crivado de balas disparadas por homens de uma unidade de elite das Forças Armadas Angolanas e da Polícia Nacional. Cumpria-se, assim, a profecia de Vitória, 19 anos depois.
Há sete anos, os Soares & companhia lançaram, em Portugal, um livro que elogia feitos de Jonas Savimbi. Quase ao mesmo tempo, em Luanda, a Comissão Política da Unita organizou uma cerimónia de homenagem ao seu “mano mais velho”.
A cerimónia de Luanda e o lançamento do livro em Lisboa contaram com a intervenção e o apoio de conhecidos “defensores” dos direitos humanos em Angola. Nestes actos foram enaltecidos feitos de um homem que queimou crianças em fogueiras, abriu à baioneta ventre de mulheres grávidas, destruiu cidades, vilas, escolas, fábricas, estradas...
Homenagear Savimbi é derramar lágrimas de crocodilo sobre as cinzas de crianças, mulheres e outros inocentes que arderam nas fogueiras da Jamba, no comboio de Zenza do Itombe e não só. E quando gestos destes engajam portugueses, demonstra bem a cumplicidade na morte de compatriotas seus em vários pontos de Angola, cuja memória mais recente é da família Viola, no Ambriz. Mais argumentos, seria exercício de mera retórica, diante da perversidade dos crimes cometidos. Savimbi incentivou o seu exército a destruir pontes, atacar cidades e, nos últimos tempos, a massacrar todos os estrangeiros que fossem capturados. Provas irrefutáveis foram divulgadas através de cassetes de vídeo apreendidas pelas FAA.
Por isso, os actos de alguns dos “nossos” mais mediáticos humanistas, resvalam dos princípios por que dizem pugnar.
Aliás, Justino Pinto de Andrade foi o primeiro a exaltar a memória de Jonas Savimbi após a sua morte, num espaço de crónicas que subscreve na Rádio Eclésia. Tratou-se de uma demonstração de afecto por um homem que violou dois acordos de paz, dizimou a família Chinguji e pactuou com o regime do apartheid da África do Sul.
Por isso, faço minha a posição de um intelectual português que classifica a morte de Jonas Savimbi como uma verdadeira tragédia, porque deveria ter acontecido 30 anos antes do dia 22 de Fevereiro de 2002.
Ainda hoje, o choro de mulheres e crianças a arder em chamas na Jamba, ecoa nos ouvidos das pessoas de bem que assistiram à carnificina. Mas não é suficiente para tocar a sensibilidade de alguns dos nossos “defensores” dos direitos humanos.
Quanto cinismo, meu Deus!
Raimundo Salvador - Jornalista angolano
A coisa mais suja na vida é a política, vivi com a UNITA e o MPLA sei um pouco de tudo na prática, vi a verdade nua e crua, uns faziam abertamente e outros secretamente e como! Não discordo do seu comentário, e até discuto com quem diz que Savimbi foi quem trouxe a democracia em Angola. Não estava lá mas tenho familiares que foram vítimas do "Setembro Vermelho". Tenta ser neutro e não toma partido de ninguém, porque não passou de um negócio onde as vítimas eramos só nós os filhos de camponês!
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