A Medalha e o Espelho
Por Artur Cussendala
Recusar uma honraria pode ser um acto nobre — desde que fundado em princípios. Mas quando a recusa é apenas uma tentativa de se destacar no palco da opinião pública, perde toda a substância e se torna teatro. Há quem rejeite medalhas mais por busca de protagonismo do que por desacordo com o seu simbolismo. E o mais curioso: muitos dos que recusam, no íntimo, sabem que nunca prestaram o serviço que a medalha representa.
Convém lembrar que o Presidente da República apenas entrega as medalhas; não é o seu proprietário. Essas distinções pertencem à Nação, não ao governo. Representam a memória colectiva, os sacrifícios históricos, a caminhada de um povo. São, acima de tudo, um símbolo do reconhecimento nacional e não uma homenagem pessoal de quem as entrega.
Se eu Cussendala fosse distinguido, e conhecendo o meu percurso, os sacrifícios que aceitei em nome de Angola, aceitaria de cabeça erguida. Mesmo que tivesse divergências políticas ou pessoais com o Chefe de Estado que as entrega, mandaria um representante. O reconhecimento não é do João Lourenço; é do país. E recusar o que é de direito, só por birra ou orgulho, seria um gesto que mais me diminuiria do que me enobreceria.
É triste ver que muitos dos agraciados estão ali apenas por serem figuras públicas — celebridades da ocasião — e não por feitos que deixaram marcas. Isso, sim, enfraquece o valor simbólico da distinção.
A medalha, como o espelho, não mente. Só incomoda quem não gosta do que vê refletido nela.
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