27 de Maio de 1977: Memória, Dor e Lições para o Futuro
Por Artur Cussendala
O dia 27 de Maio de 1977 permanece como uma das páginas mais sombrias e decisivas da história contemporânea de Angola. Não se tratou de uma mera tentativa — foi um golpe de Estado em toda a sua dimensão, que aconteceu, foi sentido, e que fracassou diante da reação rápida e brutal do poder instituído com ajuda de forças externas que guarnecia o Presidente da República.
Movido por profundas divergências internas no seio do próprio MPLA, o golpe refletiu tensões ideológicas, frustrações e confrontos de visão sobre os caminhos da recém-nascida nação angolana. A resposta do Estado, por sua vez, não se limitou a sufocar os protagonistas do levante, mas estendeu-se numa repressão em larga escala, atingindo milhares de cidadãos — muitos dos quais absolutamente alheios aos acontecimentos.
Como em todas as convulsões políticas intensas, houve vítimas inocentes. Provavelmente, a maioria. Pessoas que nada tiveram a ver com conspirações ou disputas internas de poder. Jovens, estudantes, militantes de base, profissionais e até simples transeuntes, apanhados pelo redemoinho da repressão porque, infelizmente, estavam no lugar errado, à hora errada.
Há um velho ditado que resume tragicamente esta realidade: “No duelo entre as ondas bravas do mar e as rochas duras da praia, é o mexilhão que sofre.” E assim foi. Milhares perderam a vida ou a liberdade, sem julgamento, sem defesa, sem sequer saber de que eram acusados.
Diferente de outros países africanos, onde golpes de Estado se tornaram quase rotineiros, Angola nunca mais viveu uma tentativa semelhante. O trauma de 1977 foi, talvez, suficientemente profundo para servir de aviso duradouro. Mas o silêncio, a negação ou o esquecimento não podem ser a resposta de um país que se pretende justo e democrático.
Relembrar o 27 de Maio é um dever de memória. Não para alimentar rancores ou reabrir feridas com ódio, mas para reconhecer a verdade, honrar os que tombaram injustamente e aprender com os erros do passado. A maturidade de uma nação mede-se também pela forma como lida com os seus próprios fantasmas.
Porque um país que apaga o passado condena-se a tropeçar no futuro. Que nunca nos falte coragem para lembrar e responsabilidade para não repetir.
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